SOBRE O BEM E O MAL — Vincent Cheung


Quando usamos as palavras bem e mal num discurso comum, geralmente temos uma ideia geral do que elas significam. Uma pessoa assume que sabe o que ela quer dizer com essas palavras, e que não confunde as duas. Se algo se encaixa em sua definição de “bom”, ela não a chamará de “mau”, e vice-versa.

Contudo, o que alguém considera ser bom pode não se igualar à definição do termo de outra pessoa e, assim, a última chamaria de mau o que a primeira diz ser bom. Nossos pensamentos e pontos de vista subjetivos influenciam nossas definições de bem e mal.

Mesmo assim, normalmente existe muita concordância com respeito ao nosso uso dessas palavras. Se alguém diz que um determinado indivíduo é “bom”, outra pessoa pode comumente afirmar o mesmo. Assim, embora nossas definições de bom possam diferir, há geralmente pontos suficientes de sobreposição à extensão em que a comunicação inteligível é possível. Se nossas definições de bem e mal são totalmente subjetivas e privadas, os conceitos se tornam sem significado, visto que as definições de alguém desses termos podem não coincidir com a de outra pessoa em nenhum ponto, ou em pontos irrelevantes para a situação, e uma pessoa pode nunca saber o que a outra quer dizer quando as palavras são expressas.

Embora nossos conceitos de bem e mal sejam parcialmente subjetivos, há alguns padrões objetivos governando nosso uso desses termos, de tal modo que nosso entendimento dessas palavras não é inteiramente subjetivo. Em outras palavras, nossos pensamentos, discursos e ações reconhecem implicitamente a existência de um padrão objetivo de bem, mesmo que nossas definições explícitas e usos dos conceitos de bem e mal nem sempre adiram a ele.

Contudo, se há de fato um padrão objetivo do que é bom, nossas definições são equivocadas à extensão em que nos desviamos dele. Simplesmente porque há elementos de subjetividade em nossas definições desses conceitos não significa que isso deveria ser dessa forma. Por exemplo, se nossas definições de quão longa uma polegada deveria ser são diferentes, mas exista um padrão objetivo definindo o comprimento de uma polegada, então nossas definições são erradas à medida que nos desviamos dessa definição objetiva de uma polegada.

Se há um padrão objetivo que determina o significado de bondade, então deveríamos descobrir qual é ele, e apresentar o método de conhecer tal padrão de bondade. Nesse ponto, reconhecemos que bem e mal existem, mas devemos descobrir o padrão objetivo de bondade antes de procedermos à discussão da natureza da existência do bem e do mal.

Reconhecemos implicitamente um padrão objetivo que define o que é bom. Como cristãos, cremos que Deus tem existido antes de tudo o mais, e que ele é o criador de tudo o que existe. Nós sabemos que ele é um Deus “bom” (Salmo 34:8), e, portanto, ele é aquele que define o que é bom. Paulo, em Romanos 1, nos informa que um conhecimento inato de Deus foi colocado na mente do homem, e é a partir disso que derivamos um conceito do que é bom. Contudo, Paulo também nos diz que o pecado distorce o conhecimento de Deus em nossas mentes, o que explica a falta de concordância em se definir o bem e o mal.

Para sobrepujar os efeitos do pecado sobre a mente, Deus nos transmite seus pensamentos por revelação verbal e, desse modo, a Escritura é o padrão objetivo de bondade. Visto que a Bíblia é o que Deus tem nos revelado, ela é o que Deus está nos dizendo. Se Deus é o único que determina o que é bom, e o conteúdo da Bíblia é o que Deus está nos comunicando, então tudo o que Deus disser na Bíblia que é bom, é, de fato, bom. Em outras palavras, tudo o que Deus decide ser bom é bom, e ele nos diz o que ele decidiu ser bom através da Escritura. Portanto, nosso padrão objetivo para determinar o que é bom é a Bíblia.

Podemos então perguntar como Deus decide o que é bom. Se tudo o que Deus decidiu ser bom é bom, parece possível a bondade ser diferente da forma como ela é atualmente definida. Se amor é bom simplesmente porque Deus o fez assim, então pode ser possível que Deus poderia ter considerado o ódio ser bom, e ele assim seria. Se esse é o caso, parece que a definição de bondade é arbitrária, não necessária.

Por outro lado, se há um padrão objetivo de bondade sobre o qual Deus baseie sua definição do que é bom, isso implicaria que Deus está sujeito a um padrão de bondade externo a ele. Isso implicaria que ele não tem autoridade absoluta sobre o universo.

Baseado nas considerações acima, parece que a definição de bondade ou é arbitrária, ou Deus é subserviente a algo além dele mesmo, pelo menos nessa questão do que constitui bondade. A última visão é inaceitável; a primeira visão não deve ser descartada, e será discutida adicionalmente mais abaixo.

O que a Bíblia ensina é que a bondade é inerente à natureza de Deus, e, portanto, a definição de bondade procede naturalmente dele. Dessa forma, Deus não está sujeito a algum padrão de bondade externa a ele, e a definição de bondade não é arbitrária no sentido de ser sem sentido e trivial, mas é fundamentada na natureza imutável de Deus. Por exemplo, a Bíblia diz que é bom amar. Isso procede a partir da natureza de Deus, visto que “Deus é amor” (1 João 4:8, 16).

A Bíblia diz que “Deus é luz; nele não há treva alguma” (1 João 1:5). Ela também diz que “Deus não pode ser tentado pelo mal, e a ninguém tenta” (Tiago 1:13), mas que “toda boa dádiva e todo dom perfeito vêm do alto, descendo do Pai das luzes, que não muda como sombras inconstantes” (Tiago 1:17). Isso significa que a natureza de Deus é inerentemente boa, e ela é o padrão objetivo de bondade sobre o qual todo julgamento sobre esses assuntos deve ser baseado. Deus é bom, e ele é a fonte de toda bondade. E embora ele seja por necessidade a causa última do mal, assim como ele é a causa última de tudo, não há maldade nele.

A bondade fundamentada na natureza de Deus é necessária e imutável. Por exemplo, a verdade é uma qualidade inerente na natureza divina. O buscar e o dizer a verdade são coisas boas para nós porque é da natureza de Deus dizer a verdade. Visto que a verdade é a natureza de Deus, esse é o porquê de ela ser boa, pois tudo o que Deus é é bom. Os mandamentos de Deus com respeito à veracidade, portanto, são baseados em sua natureza eterna. Isso significa que Deus nunca aprovará ações tais como perjúrio, ou qualquer tipo de mentira como sendo moral (Êxodo 20:16; Efésios 4:25; Apocalipse 21:8). Os mandamentos de Deus com respeito à verdade são necessários e imutáveis. Esse tipo de bondade está fundamentado na própria natureza de Deus, e ela é imutável, assim como Deus é imutável (Malaquias 3:6; Hebreus 13:8).

Ora, Deus define a bondade e, assim, o que ele é e faz é ipso facto bom. Tudo o que ele é e tudo o que ele faz é bom, o que significa que nenhum padrão de bondade externa a Deus pode ser usado para julgar um ato de Deus como bom ou mau. Nós derivamos a própria definição de bondade a partir do que Deus é e faz.

Como já mencionado, descobrimos o que é bom e moral através da Escritura. E no início foi dito que a visão que diz que a definição de bondade é de certa forma arbitrária não pode ser descartada. Por exemplo, era bom para os crentes do Antigo Testamento ser circuncidados somente porque Deus tinha ordenado isso. Portanto, era bom para um crente do Antigo Testamento ser circuncidado, e mau para ele o não ser.

A definição de bondade é, portanto, “arbitrária”, mas somente no sentido de que a vontade de Deus determina tudo, incluindo o padrão de bondade. Por arbitrária, portanto, não queremos dizer “existindo ou sucedendo aparentemente de maneira aleatória ou por acaso, ou como um ato de vontade caprichoso e desarrazoado”; mas, antes, como algo similar a “não restringido ou limitado no exercício de poder: governar com absoluta autoridade” (Merriam-Webster’s Collegiate Dictionary, Décima Edição).

A doutrina da simplicidade de Deus exige que consideremos seus atributos como um, o que significa que não pode haver nenhuma separação entre sua vontade e natureza. Todas as coisas, nesse sentido, são arbitrárias por necessidade, visto que não há explicação mais última para algo do que dizer que Deus a desejou, e não há nada anterior à vontade de Deus que dite ou influencie o que ele deseja. Ele é amor e ele desejou ser amor; ele desejou ser amor e ele é amor. A vontade de Deus é a expressão final; não há nenhuma causa anterior.

Portanto, o fato de alguém matar outra pessoa não é inerentemente imoral, mas é somente devido ao mandamento de Deus: “Não matarás”. Do mesmo modo, teria sido imoral para Abraão se refrear de preparar Isaque para o sacrifício, uma vez que Deus o tinha ordenado a fazê-lo — em outro contexto, chamaríamos isso de assassinato. Se Deus não tivesse detido a mão de Abraão, ainda teria sido bom para ele ter matado Isaque — simplesmente porque Deus tinha ordenado isso. A justificativa para a pena de morte é derivada da mesma forma. Deus tem soberania completa sobre toda criação, e tudo o que ele ordena é bom por definição.

Com tudo isso em mente, estamos prontos agora para discutir ainda mais a natureza da existência do bem e do mal. Como temos mencionado, sabemos que o bem e o mal existem, mas estamos interessados também em conhecer a forma da sua existência. Isso é significante porque alguns sistemas religiosos e filosóficos afirmam que não há tal coisa como bem e mal. Alguns se focam sobre a não existência do mal, mas afirmam a existência do bem. Como cristãos, então, devemos ir além de meramente afirmar a existência do bem e do mal, mas também clarificar nossa posição quanto às formas de sua existência. Os cristãos creem tanto na existência do bem quanto do mal, mas é preciso definir em que sentido se crê que essas coisas existem.

Deus tem existido na eternidade; o próprio tempo foi criado por ele. Isso significa que, antes da criação do universo, Deus tinha existido sozinho. E visto que a Escritura ensina que não há mal em Deus, a questão que se levanta é quanto à fonte e origem do mal. Nós não podemos dizer que o próprio Deus, embora não haja mal nele, cometeu o mal; a Escritura nega essa possibilidade. Tiago 1:16-17 afirma: “Meus amados irmãos, não se deixem enganar. Toda boa dádiva e todo dom perfeito vêm do alto, descendo do Pai das luzes, que não muda como sombras inconstantes”. Se Deus é a fonte de “toda boa dádiva e todo dom perfeito”, e ele “não muda”, isso significa que ele não realiza alguma outra coisa senão aquilo que é bom.

Uma resposta consistente com o registro bíblico seria que Deus criou criaturas com a capacidade de escolher, embora ele possua controle completo sobre até mesmo suas vontades, e que foi bom para ele ter feito assim. Mas, essas criaturas, pelo bom decreto soberano de Deus, decidiram fazer escolhas que eram contrárias à bondade de Deus, e, portanto, resultaram no mal. Devemos insistir, contrário ao “livre-arbítrio” do humanismo, que Deus não meramente “permitiu” o mal, mas ele o decretou; de outra forma, ele não poderia ter se originado.

Ora, a Bíblia diz que se não houvesse lei moral, então não haveria nenhum pecado. Portanto, pecado é uma transgressão da lei moral. Visto que a lei moral declara o que é bom, o mau é, dessa forma, um desvio dessa bondade objetiva, e não é, portanto, realmente uma coisa em si mesma. O que se segue a partir disso é que a bondade pode existir sem o mau, mas o mau não pode existir sem a bondade objetiva. Se mau, como parece, é um “não deve”, então ele não pode existir sem um “deve”. É possível haver um padrão de bondade objetivo sem qualquer desvio dele, mas não é possível haver um desvio da bondade se a própria bondade não é definida ou não existe.

Por exemplo, é concebível ter um limite de velocidade sem qualquer violação dele, mas é impossível violar o limite de velocidade se não existe tal coisa. Da mesma forma, somente é possível existir o mal se houver o bem, mas é possível que haja o bem sem a existência do mal. Deus não precisa de Satanás para defini-lo.

O mal, de fato, existe, mas não como uma coisa em si mesma; antes, ele é um desvio do bem. Isso não significa que o mal seja uma ilusão, como alguns sistemas de pensamento não cristãos afirmam, mas que ele não tem existência independente e objetiva, como no caso da bondade. Resumindo, a bondade é definida pela palavra de Deus, e o mau é, consequentemente, definido pela (o desvio da) bondade. O que Deus diz que é bom é bom; o que se desvia ou contradiz o que ele diz é mau.

A implicação é que bem e mal são necessariamente diferentes. Eles não são conceitos impostos sobre um mundo moralmente neutro. Algumas coisas são de fato boas, e algumas coisas são de fato más — as duas não são a mesma coisa. A lei moral de Deus não pode ser considerada como relativa. Se ela define um “bom” dentro de uma categoria, então qualquer coisa que se desvia dela é mau. O mal é um desvio do bem, e um desvio de alguma coisa não pode ser o mesmo que a coisa da qual ele se desviou. Portanto, bem e mal são necessariamente diferentes. A Bíblia nos instrui a obedecer à palavra de Deus, e a “não se desviar dela, nem para a direita nem para a esquerda” (Josué 1:7; vd. Deuteronômio 28:14; Provérbios 4:27).

Não somente bem e mal são diferentes, mas eles estão um contra o outro. O bem não concorda com o seu desvio, e o desvio do bem não concorda com o padrão objetivo de bondade. Não pode haver concórdia entre o bem e o mal. Como a Escritura diz: “… Pois o que têm em comum a justiça e a maldade? Ou que comunhão pode ter a luz com as trevas? Que harmonia entre Cristo e Belial? Que há de comum entre o crente e o descrente?” (2 Coríntios 6:14-15); “… a amizade com o mundo é inimizade com Deus… Quem quer ser amigo do mundo faz-se inimigo de Deus” (Tiago 4:4). E o próprio Jesus diz: “Aquele que não está comigo, está contra mim; e aquele que comigo não ajunta, espalha” (Mateus 12:30).

Algo que é mau nunca pode ser chamado de bom, e algo que é bom nunca pode ser chamado de mau. Se há um limite de velocidade, então todas as violações do limite de velocidade são consideradas violações. É verdade que há diferentes graus de desvios do bem (Lucas 12:47; Êxodo 21:12-13), assim como é verdade com as violações de limite de velocidade. Mas quando estamos considerando as próprias categorias de bem e mal, e não meramente o grau de proximidade do padrão objetivo, qualquer desvio do bem pertence à categoria de mal, assim como qualquer desvio do limite de velocidade é uma violação do limite de velocidade.

Dado o exposto acima, o crente deve rejeitar as teorias seculares sobre o assunto, que se rebelam contra a lei moral de Deus e sua reivindicação sobre suas vidas. Por exemplo, o subjetivismo declara que a verdade e moralidade são sujeitos ao indivíduo. Ele determina o que é bom e o que é mau, e o que ele decide será verdade até onde lhe disser respeito. O relativismo afirma que a verdade e a moralidade são relativas à situação. O que é bom numa situação pode ser mau em outra. A bondade é relativa, e não objetiva.

Essas posições pressupõem a falsidade da cosmovisão cristã. Para seus aderentes serem consistentes, uma pessoa não deve punir outra por fazer algo contra ela enquanto essa outra pessoa considerar o que ela está fazendo como sendo moral, mesmo que isso seja roubo ou assassinato. De outra forma, o subjetivista ou relativista estaria impondo seu próprio padrão moral sobre o outro, o que significa que ele considera seu próprio padrão moral como objetivamente verdadeiro e universalmente obrigatório — um que deveria ser reforçado sobre aqueles que discordam dele sobre o assunto. Isso, consequentemente, significa que seus padrões morais, no final das contas, são objetivos na natureza. O subjetivismo e o relativismo se refutam imediatamente quando declarados. Se a verdade é subjetiva ou relativa, a afirmação de que a verdade é subjetiva ou relativa é, em si mesma, subjetiva ou relativa — a afirmação se autodestrói.

Contra essas e outras oposições, a posição cristã reconhece que bem e mal são reais e estritamente definidos. As linhas são muito claras, e elas são definidas pelas palavras da Escritura. Para resumir, bem e mal são reais — eles existem. A bondade tem existência real no sentido de que ela é baseada na revelação verbal de Deus na Escritura. O mal, por outro lado, é qualquer desvio de sua lei moral. Se a lei de Deus define o que é o “deve”, então o mal é qualquer “não deve”. Nós ganhamos conhecimento do que é bom e mau através da Bíblia. Isto é, através da Escritura, Deus nos diz o que é bom e o que é o desvio da bondade, ou seja, o mal.

A Bíblia diz em Isaías 5:20: “Ai dos que chamam ao mal bem e ao bem, mal, que fazem das trevas luz e da luz, trevas, do amargo, doce e do doce, amargo!”. O versículo nos adverte a definir o bem e o mal como Deus os define. Não deveríamos confundir os dois e perverter suas definições dessas duas coisas. Se algo é bom de acordo com Deus, deveríamos chamá-lo de bom. Deveríamos endossá-lo, louvá-lo e persegui-lo. Se algo é mau aos seus olhos, deveríamos chamá-lo como tal. Deveríamos rejeitá-lo, atacá-lo e sobrepujá-lo.

A Escritura também tem algo a dizer com respeito ao nível de entendimento que deveríamos ter sobre o bem e o mal. O apóstolo Paulo diz, em Romanos 16:19, que devemos ser “sábios em relação ao que é bom, e sem malícia em relação ao que é mau”. Em outro lugar, a Bíblia registra a atitude de Deus para com os ímpios, dizendo: “O meu povo é tolo, eles não me conhecem. São crianças insensatas que nada compreendem. São hábeis para praticar o mal, mas não sabem fazer o bem” (Jeremias 4:22). Os ímpios não somente praticam o mal, mas eles também o entendem, de modo que se tornam hábeis em sua busca dele. Por outro lado, eles são ignorantes quando diz respeito a pensar e praticar o bem.

Nós não devemos ser hábeis em praticar coisas más, como é verdade com aqueles que são “tolos”, e que são “insensatos”. Aqueles que são “hábeis para praticar o mal” são ditos ser “sem entendimento”. Os cristãos são frequentemente ridicularizados por amigos ou colegas de trabalho quando eles parecem ter carência de conhecimento ou experiência em atividades seculares e pecaminosas. Isso pode incluir alcoolismo, uso de drogas, linguagem obscena, desonestidade, gracejos imorais, roubo e várias outras coisas. Os cristãos deveriam estar confiantes de que eles estão no caminho correto e os incrédulos estão no caminho errado. Deus não deseja que sejamos versados na maneira de viver perversa, embora ele queira que sejamos capazes de reconhecer o mal, de modo que possamos evitá-lo. Por outro lado, Deus deseja que sejamos “sábios sobre o que é bom”, de modo que possamos entender e praticar o que é bom. Isso é agradável aos olhos de Deus.

Em nossa cultura, o bem é frequentemente perseguido como tendo mente fechada e sendo restritivo, e o mal é frequentemente aprovado como libertador, respeitoso e tolerante. O cristão nunca deveria comprometer os princípios de Deus para se conformar aos conceitos do mundo de bem e mal, visto que os incrédulos pervertem o bom julgamento por meio de suas luxúrias e desafio grosseiro contra Deus. Deveríamos entender o bem e o mal à medida que podemos diferenciar entre eles, mas não deveríamos entender o mal de uma forma que sejamos hábeis e inteligentes em como buscá-lo. Devemos, contudo, ser sábios nas coisas que são boas, para que possamos nos desenvolver nelas.

De acordo com a Escritura, não somente devemos evitar o mal, mas devemos ser contra ele — devemos odiá-lo. Romanos 12:9 afirma: “O amor deve ser sincero. Odeiem o que é mau; apeguem-se ao que é bom”. Devemos nos apegar, segurar com força, ao que é bom, mas devemos nos colocar contra o que é mau. Devemos atacá-lo. Outro versículo na Bíblia ecoa esse pensamento, mas também o aplica adicionalmente ao sistema de justiça. Ele diz: “Odeiem o mal, amem o bem; estabeleçam a justiça nos tribunais” (Amós 5:15). Os conceitos seculares de unidade e amor esperam que comprometamos até mesmo o sentido de bem e mal para Deus, mas isso nunca deveria ser feito.

Assim, não devemos simplesmente preferir o bem de uma maneira passiva, mas devemos ativamente nos apartar do que é mal, e ativamente buscar o que é bom. A Escritura declara em 1 Pedro 3:10-12: “Pois ‘quem quiser amar a vida e ver dias felizes, guarde a sua língua do mal e os seus lábios da falsidade. Afaste-se do mal e faça o bem; busque a paz com perseverança. Porque os olhos do Senhor estão sobre os justos e os seus ouvidos estão atentos à sua oração, mas o rosto do Senhor volta-se contra os que praticam o mal’”. E, em outro lugar, ela diz: “Busquem o bem, não o mal, para que tenham vida. Então o SENHOR, o Deus dos Exércitos, estará com vocês, conforme vocês afirmam” (Amós 5:14). Também: “Desvie-se do mal e faça o bem; e você terá sempre onde morar” (Salmo 37:27).

Desvie-se, portanto, do que é mau, e siga aquilo que é bom. Bem e mal são claramente distinguíveis com base nos preceitos divinos registrados na Escritura. Esse é o porquê Deus pode esperar que vejamos aquilo que é mau, e aquilo que é bom, e então façamos uma decisão consciente de nos desviar do mau, e buscar o que é bom e pacífico.

Desviar-se do mal não significa que devemos ignorar sua presença no mundo. Devemos sobrepujá-lo e atacá-lo: “Não se deixem vencer pelo mal, mas vençam o mal com o bem” (Romanos 12:21). O bem pode sempre triunfar sobre o mal, e o certo sempre é mais poderoso do que o errado. A verdade é sempre mais poderosa do que a falsidade. A luz é sempre mais poderosa do que as trevas. Por outro lado, as trevas nunca podem sobrepujar a luz. Como cristãos, somos filhos da luz (1 Tessalonicenses 5:5), e, portanto, podemos estar confiantes de que, se permanecermos verdadeiramente no bem, isto é, se permanecermos fiéis a Deus, triunfaremos nessa vida. Como o apóstolo João diz: “Quem é que vence o mundo? Somente aquele que crê que Jesus é o Filho de Deus” (1 João 5:5).

Percebendo a relevância desse assunto, seria natural alguém perguntar como ele pode clara e acertadamente discernir entre o bem e o mal. Como podemos saber o que Deus pode pensar de cada assunto? Já temos estabelecido a Bíblia como o padrão objetivo de bondade, e o que se segue desenvolverá várias implicações desse fato.

Visto que o padrão objetivo de bondade é a palavra de Deus, e o mau é tudo aquilo que se desvia desse padrão objetivo de bondade, sabemos que se pudermos adquirir conhecimento do conteúdo da revelação divina, saberemos o que constitui a bondade, e também o que é mau.

Uma das passagens mais relevantes e instrutivas da Escritura a este respeito é Hebreus 5:12-14: “Embora a esta altura já devessem ser mestres, vocês precisam de alguém que lhes ensine novamente os princípios elementares da palavra de Deus. Estão precisando de leite, e não de alimento sólido! Quem se alimenta de leite ainda é criança, e não tem experiência no ensino da justiça. Mas o alimento sólido é para os adultos, os quais, pelo exercício constante, tornaram-se aptos para discernir tanto o bem quanto o mal”.

Agora, o versículo 12 diz: “Embora a esta altura já devessem ser mestres, precisam de alguém que ensine a vocês novamente os princípios elementares da palavra de Deus”. A primeira parte declara que, “a esta altura”, alguns dentre a audiência da Epístola aos Hebreus “já deveriam ser mestres” — implicando que o tempo deveria ser um fator no crescimento espiritual. Isso não é dizer que quanto mais tempo uma pessoa tiver de cristão, mais espiritualmente madura ela será, mas que quanto mais tempo uma pessoa tiver de cristão, mais espiritualmente madura ela deveria ser.

Todavia, devido às suas falhas de caráter e negligência, uma pessoa pode permanecer um infante espiritual a despeito de ter sido um cristão por um longo tempo. Portanto, há aqueles que deveriam ser mestres sobre outros crentes, visto que eles têm sido cristãos há muitos anos, mas permanecem como infantes espirituais, que “precisam de alguém que lhes ensine novamente as verdades elementares da palavra de Deus”. Não que nunca eles tivessem sido ensinados sobre “as verdades elementares da palavra de Deus”; mas que, devido à falta de crescimento e aptidão espiritual deles, eles precisavam ser ensinados “novamente” sobre essas coisas.

O próximo versículo diz: “Estão precisando de leite, e não de alimento sólido! Quem se alimenta de leite ainda é criança, e não tem experiência no ensino da justiça”. O versículo anterior afirma que os leitores tinham permanecido como infantes espirituais, e embora devessem ter amadurecido o suficiente para serem mestres na época em que estavam lendo a epístola, eles não tinham amadurecido até aquele grau. Portanto, eles precisavam ser tratados como infantes espirituais, que se alimentam de leite ao invés de alimento sólido!

Obviamente, o escritor da epístola não está se referindo ao leite físico e ao alimento sólido literal, mas comparando “as verdades elementares da palavra de Deus” com o leite, e o ensino de teologia mais avançado com o “alimento sólido”. Assim, há tal coisa como “verdades elementares” na Bíblia, enquanto outras podem ser consideradas como ensinos intermediários ou avançados, ou “alimento sólido” , apropriado para adultos espirituais. Aqueles que “[vivem] de leite” são infantes espirituais, caracterizados pelo fato de que eles não “têm experiência no ensino da justiça”.

A passagem continua a dizer: “Mas o alimento sólido é para os adultos, os quais, pelo exercício constante, tornaram-se aptos para discernir tanto o bem quanto o mal”. Os adultos se alimentam de alimento sólido. Visto que estamos falando do nível de verdades na Escritura, isso significa que os infantes espirituais se alimentam de leite, ou “verdades elementares” , e o espiritualmente adulto de “alimento sólido”, ou de ensinos mais avançados da palavra de Deus.

São os espiritualmente adultos, ou aqueles que se alimentam de verdades mais avançadas da palavra de Deus, que “tornaram-se aptos para discernir tanto o bem quanto o mal”. Isso tem várias ramificações para a nossa discussão. Primeiro, significa que os infantes espirituais não são capazes de “distinguir o bem do mal”, e, como temos observado, esses são identificados pelo fato de que eles ainda estão se alimentando de leite espiritual, ou “verdades elementares”. Simplesmente em razão de que uma pessoa tem sido um cristão por muitos anos não significa que ela seja espiritualmente madura. Antes, devido à falta de iniciativa e negligência, ela pode “precisar de alguém que lhe ensine novamente as verdades elementares da palavra de Deus”.

Por outro lado, o adulto espiritual é alguém que “pelo exercício constante, tornou-se apto para distinguir o bem do mal”, significando que essa pessoa constantemente trabalha com a palavra de Deus e, por meio disso, tem treinado a si mesma a ponto de poder discernir o que é bom e o que é mau. Tal pessoa não confundirá as duas coisas e não perverterá o bom julgamento. O espiritualmente adulto é identificado com aqueles que podem participar do “alimento sólido”, ou dos conteúdos maduros e avançados da palavra de Deus.

Portanto, nem todo cristão pode discernir o bem do mal claramente, mas somente aqueles que são espiritualmente maduros podem ser confiáveis para tais questões. Infantes espirituais não somente são ignorantes e inexperientes com a palavra de Deus, mas eles comumente são levados por sentimentalismos, luxúrias, emoções, preferências, ensinos populares, cultura popular e, de todas as formas, a pressão sempre lhes está compelindo. Segue-se que o julgamento dos espiritualmente imaturos, definido aqui como aqueles que não avançaram além dos estudos teológicos básicos, não é confiável.

Esses deveriam tomar iniciativa para serem treinados de modo que eles eventualmente se tornem capazes de discernir o bem do mal. Somente então os seus julgamentos podem ser considerados confiáveis, e somente então podem instruir apropriadamente a outros na fé. Visto que aqueles que não são avançados teologicamente são necessariamente imaturos, segue-se que todos os cristãos anti-intelectualistas são apenas infantes espirituais.

Uma pessoa não pode depreciar o intelecto e os estudos teológicos e, ao mesmo tempo, ser um cristão maduro. Aqueles que têm muitas experiências místicas, ou que são extremamente emotivos durante o louvor, são normalmente muito imaturos na fé. Esse é certamente o caso se eles ainda estão se alimentando de leite espiritual, e nunca se moveram para se alimentar do alimento sólido da palavra de Deus. Em outras palavras, podemos avaliar a maturidade espiritual de alguém observando sua dieta espiritual. Ele resiste aos estudos teológicos como muito “acadêmicos” ou “intelectuais”? Ele insiste em permanecer com as verdades “simples” e “práticas” da palavra de Deus? Tais coisas são popularmente ditas; mas, de acordo com a Bíblia, isso reflete uma imaturidade espiritual.

Ao mesmo tempo, essa passagem nos diz para aprimorarmos nossa capacidade de discernir o bem do mal. Deveríamos buscar maior conhecimento bíblico e entendimento teológico. Deveríamos buscar entender mais os assuntos avançados na Escritura. Rejeitar os estudos doutrinários é autoenganador. Se buscarmos conhecimento e entendimento por meio da palavra de Deus, cresceremos até o estágio em que teremos treinado a nós mesmos para distinguir o bem do mal. Baseado nessa passagem, uma pessoa deve admitir que alguém não está preparado para discernir o bem do mal se não for versado na palavra de Deus. Não há como escapar desse fato — uma pessoa não é um adulto espiritual se ela nunca se moveu além da dieta de um infante.

Visto que o caminho para a maturidade e o discernimento espiritual está fundamentado em nosso conhecimento de teologia, aí é onde a nossa estratégia deveria estar baseada. Isto é, devemos enfatizar o ensino doutrinário na igreja, na família, e nas vidas dos indivíduos. Não deveríamos enfatizar a experiência subjetiva ou o emocionalismo, mas a profundidade e o escopo em nosso entendimento da Escritura. Não somente isso envolve um longo processo de estudo e reflexão cuidadosos, mas também consciência e aplicação constante dos preceitos de Deus. Somente então há esperança para uma pessoa se tornar treinada pela palavra de Deus e, por meio disso, tornar-se alguém que seja capaz de discernir o bem do mal.

Requer-se que os ministros enfatizem doutrinas. Eles nunca deveriam se comprometer com aqueles que gostam apenas de sermões emotivos que são sem substância escriturística e intelectual. O apóstolo Paulo predisse que “virá o tempo em que não suportarão a sã doutrina; ao contrário, sentindo coceira nos ouvidos, juntarão mestres para si mesmos, segundo os seus próprios desejos” (2 Timóteo 4:3).

São aqueles com “coceira nos ouvidos” — e os ministros que se acomodam a eles — que são responsáveis pela presente fraqueza espiritual e intelectual na igreja. Não é nenhum segredo que os cristãos carecem de discernimento espiritual na maioria das áreas de suas vidas; todavia, eles continuam a resistir todo ensino doutrinário que os ajudará a remediar a situação. Eles se recusam a ouvir “o que o Espírito [está dizendo] às igrejas” (Apocalipse 2:7).

Jesus deu “alguns para apóstolos, outros para profetas, outros para evangelistas, e outros para pastores e mestres, com o fim de preparar os santos para a obra do ministério, para que o corpo de Cristo seja edificado, até que todos alcancemos a unidade da fé e do conhecimento do Filho de Deus, e cheguemos à maturidade, atingindo a medida da plenitude de Cristo. O propósito é que não sejamos mais como crianças, levados de um lado para outro pelas ondas, nem jogados para cá e para lá por todo vento de doutrina e pela astúcia e esperteza de homens que induzem ao erro. Antes, seguindo a verdade em amor, cresçamos em tudo naquele que é a cabeça, Cristo” (Efésios 4:11-15). O ministro a quem Deus chama é equipado com dons e habilidades especiais para educar e treinar os crentes, de modo que eles “não sejam mais como crianças” que são “jogados para cá e para lá por todo vento de doutrina”.

Portanto, os ministros deveriam ser ávidos em pregar, corrigir, repreender e exortar (2 Timóteo 4:2), e “… ensinar… com toda autoridade. Ninguém o despreze” (Tito 2:15). Eles podem até mesmo precisar “repreender [alguns] severamente, para que sejam sadios na fé” (Tito 2:13). Por outro lado, aos cristãos é ordenado: “Obedeçam aos seus líderes e submetam-se à autoridade deles. Eles cuidam de vocês como quem deve prestar contas. Obedeçam a eles, para que o trabalho deles seja uma alegria e não um peso, pois isso não seria proveitoso para vocês” (Hebreus 13:17). Como o apóstolo declara em 1 Timóteo 5:17, “Os presbíteros que lideram bem a igreja são dignos de dupla honra, especialmente aqueles cujo trabalho é a pregação e o ensino”. Aqueles que são capazes de pregar e ensinar com exatidão doutrinária e substância intelectual deveriam ser considerados como os recursos mais preciosos em nossas igrejas, isto é, aqueles que são capazes de “encorajar outros pela sã doutrina e de refutar os que se opõem a ela” (Tito 1:9).

O melhor tempo para começar o treinamento de alguém na justiça não é quando ela é um infante espiritual, mas quando é um infante natural. Os pais deveriam assumir a responsabilidade de treinar seus filhos nas coisas espirituais, e ajudá-los a adquirir conhecimento da palavra de Deus, para que possam aprender a discernir o bem do mal, o certo do errado, a sabedoria da tolice, ainda cedo na vida. É uma lástima que muitos pais cristãos, sendo fisicamente adultos, sejam eles mesmos infantes espirituais. Eles deveriam se esforçar para crescer espiritualmente, de modo que pudessem assumir a liderança espiritual no lar, e não permitir que a influência secular o invadisse e sobrepujasse.

Como o início do livro de Provérbios afirma, “Os provérbios… ajudarão a experimentar a sabedoria e a disciplina; a compreender as palavras que dão entendimento; a viver com disciplina e sensatez, fazendo o que é justo, direito e correto; ajudarão a dar prudência aos inexperientes e conhecimento e bom senso aos jovens. Se o sábio lhes der ouvidos, aumentará seu conhecimento, e quem tem discernimento obterá orientação para compreender provérbios e parábolas, ditados e enigmas dos sábios. O temor do SENHOR é o princípio do conhecimento, mas os insensatos desprezam a sabedoria e a disciplina” (Provérbios 1:1-7).

O temor do Senhor é o “princípio do conhecimento” — não o objetivo final. Em outro lugar, as Escrituras dizem que “O temor do SENHOR é o princípio da sabedoria, e o conhecimento do Santo é entendimento” (Provérbios 9:10). A reverência e a fé para com Deus é o ponto de partida de uma educação legítima. Ninguém é sábio, e ninguém tem verdadeiro conhecimento sem ter primeiro o temor do Senhor. Os cristãos não deveriam deixar o mundo convencê-los de que é tolice crer em Deus ou obedecer aos seus mandamentos.

Paulo afirma com respeito àqueles que suprimem seu conhecimento inato de Deus e a evidência dele na criação, que “dizendo-se sábios, tornaram-se loucos” (Romanos 1:22). Não é algo inteligente ser um ateu; nem é algo inteligente se rebelar contra Deus; não é algo inteligente zombar daqueles que se devotam à teologia cristã; antes, “que adianta ao homem ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma?” (Marcos 8:36).

Saiba que existe o bem, e que existe o mal. Os dois não são a mesma coisa, e Deus não quer que os confundamos. Ele quer que sejamos capazes de dizer a diferença entre os dois, e que sejamos sábios e possuamos discernimento profundo com respeito à bondade, mas ele não quer que sejamos hábeis com respeito a como planejar e realizar o mal. Para que tal coisa ocorra, devemos ser versados na palavra de Deus. Os ministros que amam suas congregações deveriam enfatizar os sermões doutrinários, ao invés de se comprometerem com aqueles que têm “coceiras nos ouvidos”. Os pais que amam os seus filhos deveriam começar a ensiná-los a teologia cristã desde a tenra idade, pois se você educar uma criança com um senso de certo e errado baseado na revelação da Escritura, “mesmo com o passar dos anos [ela] não se desviará dele” (Provérbios 22:6).
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Vincent Cheung. Capítulo 1 de On Good and Evil (2002), pp. 5-15. Traduzido por Luan Tavares.

Sobre o autor: Vincent Cheung é um pregador e escritor cristão. Ele e sua esposa moram nos Estados Unidos.
Site oficial: https://www.vincentcheung.com/

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